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Relembre uma das maiores polêmicas da Rússia: o assassinato de Alexander Litvinenko

Luciana Calogeras

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Alexander Valterovich Litvinenko foi um ex-oficial russo naturalizado britânico, atuante no Serviço Federal de Segurança (SFS ou FSB, sucessor do KGB). Ele se especializou no combate ao crime organizado e, de acordo com diplomatas dos Estados Unidos, Litvinenko cunhou a expressão “Estado mafioso”.

Durante sua permanência em Londres ele escreveu dois livros, acusando os serviços secretos russos de encenar os bombardeios contra apartamentos russos e outros atos terroristas, como as crises de reféns da escola de Beslan e do teatro de Dubrovka, em um esforço para levar Vladimir Putin ao poder.

A vida de Valterovich sempre esteve envolvida com muita polêmica, como também foi a sua morte: no dia 1 de novembro de 2006, Litvinenko adoeceu repentinamente e foi hospitalizado. Ali, estabeleceu-se que se tratava do caso de envenenamento por polônio-210 radioativo.

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No dia 23 de novembro ele veio a falecer, se tornando a primeira vítima conhecida da síndrome aguda de radiação induzida por polônio-210.

Os eventos que levaram a isso? Bem, ninguém sabe… mas existem teorias diversas a respeito, o que fez esta ser uma das maiores polêmicas de toda a Rússia.

Como Alexander era naturalizado britânico, o Reino Unido exigiu a extradição de Lugovoy, o que é contrário à Constituição da Rússia, proibindo a extradição de seus cidadãos, o que o levou ao desgaste das relações entre a Rússia e o Reino Unido.

Por muitos anos o caso permaneceu sem solução quando, em outubro de 2011, a esposa de Alexander, Marina Litvinenko, auxiliada pelo biólogo Alexander Goldfarb, iniciou uma incessante busca pela verdade: ela havia ganhado o direito de que um inquérito sobre a morte do marido fosse conduzido por um médico legista em Londres.

O inquérito foi repetidamente adiado por questões relacionadas a evidências examináveis, sendo que apenas em 2015 um inquérito público foi iniciado.

Em 2016, mais especificamente no mês de janeiro, surgiram hipóteses de que o assassinato de Litvinenko foi uma operação do SFS, pessoalmente aprovada por Vladimir Putin e Nikolai Patrushev, que na época era diretor do SFS.
Andrei Lugovoi e Dmitry Kovtun, dois “turistas russos” chegaram em Londres durante o outono de outubro de 2016. Algumas antes, a dupla havia passado pela alfândega britânica sem ser detectada.

Lugovoi e Kovtun não levavam drogas ou quantias absurdas de dinheiro, entretanto, carregavam algo tão surreal que aquilo nunca havia sido visto antes no Reino Unido: polônio-210, um isótopo altamente radioativo. O material é, provavelmente, o veneno mais tóxico conhecido pelo homem caso seja inalado ou ingerido, 100 bilhões de vezes mais mortal que o cianeto de hidrogênio.

A dupla teria sido enviada pelo Serviço de Segurança Federal da Rússia (FSB), em uma operação que, quase certamente, foi aprovada por Vladimir Putin. E o objetivo deles era simples: envenenar Alexander Litvinenko, então funcionário do MI6 e crítico do Kremlin.

O Polônio-210 teria provindo de um reator nuclear russo, sendo um elemento perfeito para um envenenamento.

Por emitir partículas alfa – o que torna sua radiação de curto alcance – o polônio-210 emite radiação de curto alcança – o que o torna incapaz de atravessar paredes, sendo ideal para ser transportado sem que se perceba, sobretudo por sua quantidade exigida para o envenenamento ser bem pequena.

Os detectores de radiação comuns são feitos para ‘enxergarem’ a radiação gama e, por emitir partículas alfa, os dois homens conseguiram entrar na Inglaterra sem serem percebidos.

Não se sabe exatamente como os homens transportaram o polônio, porém mais tarde foi possível identificar várias coisas que os assassinos tocaram ou lugares onde estiveram.

O contato entre Lugovoi, Kovtun e Litvinenko começou logo pela manhã: às 11h49 daquele 16 de outubro, quando os dois desembarcaram no aeroporto de Gatwick, um primeiro contato foi feito com Alexander. Lugovoi havia se apresentado como um parceiro de negócios que dava mentorias para empresas que buscavam investir na Rússia.

Os assassinos viajaram de trem para o centro de Londres, onde se hospedaram no hotel Best Western na Shaftesbury Avenue. Então, saindo rumo ao encontro, eles quebraram uma das principais regras da espionagem: não chamar a atenção.

Ambos estavam trajados como verdadeiros gângsters: Kovtun estava vestindo um terno de poliéster metálico prateado e Lugovoi vestia xadrez. Eles combinaram suas roupas brilhantes com camisas e gravatas coloridas, além de usarem várias joias enormes.
Eles se encontraram por volta das 15h na Grosvenor Street. Após um pouco de conversa fiada, Lugovoi, em tom de brincadeira, sugeriu que todos bebessem um pouco de chá, visto que estavam na Inglaterra e precisavam respeitar o costume local.

No encontro também estava Tim Reilly, o chefe da empresa, que por ventura falava russo. Reilly recusou, mas serviu uma xícara da bebida para cada um dos presentes na reunião. Pouco depois, Tim, por acaso, acabou indo ao banheiro, o que abriu a brecha perfeita para o polônio ser colocado no copo de Litvinenko.

Acontece que o chá não foi bebido por Alexander. Isso foi constatado mais tarde, já que a mesa onde o encontro aconteceu estava cheia de material radioativo. Os russos, por outro lado, alegaram que foi Litvinenko que tentou os envenenar durante seu primeiro encontro significativo em Mayfair.

Porém, a hipótese foi facilmente refutada quando a Scotland Yard reconstruiu a jornada de todos os envolvidos: o trajeto de Litvinenko de sua casa para Green Park estava limpo. Já Lugovoi e Kovtun deixavam uma mancha nuclear sinistra onde quer que fossem, incluindo seus quartos de hotel, contaminado bem antes de seu primeiro encontro com Litvinenko.

Lugovoi manuseou polônio na privacidade de seu quarto, onde parece tê-lo transferido de um recipiente para outro, jogando o excesso na pia do banheiro, onde leituras maciças de radiação alfa foram identificadas. No dia seguinte, os russos trocaram de hotel, muito provavelmente, para se distanciar do veneno que Andrei Lugovoi havia descartado no banheiro.

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Enquanto isso, Litvinenko sentiu-se levemente mal, vomitando uma única vez. Seu espasmo de vômito foi devido à exposição à radiação — que pode ter sido causada por ele inalar um pouco do veneno que exalava de seu chá, mesmo à distância.

Após a primeira falha, Andrei Lugovoi foi enviado novamente ao Reino Unido, desta vez sozinho. Ele voou em 25 de outubro de Moscou para Londres, no voo 875 da British Airways. Naquele mesmo dia, mais tarde, Lugovoi encontrou Litvinenko no Palm Court, no térreo, num salão de chá da tarde. Porém, por razões desconhecidas, também não foi desta vez que o plano foi concluído por conta das câmeras de segurança do local que o fizeram abortar a missão.

Litvinenko só foi envenenado na terceira tentativa e, 1 de novembro de 2006, adoeceu repentinamente e foi hospitalizado. Ele morreu três semanas depois, tornando-se a primeira vítima confirmada da síndrome letal de radiação aguda induzida por polônio-210.

Em seu leito de morte, ele mesmo apontou a FBS e o presidente russo Vladimir Putin como os responsáveis pelo ocorrido.
“Você pode conseguir silenciar um homem, mas o uivo de protestos de todo o mundo, Sr. Putin, reverberará em seus ouvidos pelo resto da sua vida” – disse ele antes de morrer.

Em setembro de 2021 o Tribunal Europeu de Direitos Humanos na França, concluiu que a Rússia foi a responsável pela morte de Alexander Litvinenko, mesmo com o Kremlin sempre negando as acusações. De acordo com o Tribunal, o Kremlin não respondeu de maneira “satisfatória” e tampouco conseguiu refutar as acusações do caso. Sendo assim, estabeleceu-se o pagamento de 100 mil euros em danos morais para a viúva de Litvinenko.

O inquérito também sugere que Putin tenha muito provavelmente aprovado a operação.

A maneira como o assassinato se deu e como Lugovoi e Kovtun colocaram em prática uma ação dessas proporções, leva o mundo a crer que tenha realmente sido algo organizado pelo Serviço de Segurança Federal da Rússia.

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Luciana é profissional da área de tradução há mais de 15 anos, atuando também como professora de Inglês. Trabalha no Mistérios do Mundo desde 2016 como redatora e roteirista e em horas vagas é pesquisadora curiosa em diversas áreas do conhecimento.

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