Início » Saúde » Quantos mortos pelo coronavírus poderão acontecer no Brasil?

Quantos mortos pelo coronavírus poderão acontecer no Brasil?

Leonardo Ambrosio

Publicado em

Modelo matemático desenvolvido por brasileiros afirma que, no pior dos casos, a doença retrocederá apenas depois de correr todo o seu curso natural.

Diante da atual crise provocada pelo surto de coronavírus no mundo inteiro, o Brasil se prepara para um longo período de temor e insegurança em relação à saúde nacional. Como diversas autoridades já disseram ao redor do mundo, o maior desafio de todas as nações neste momento é “achatar” a curva nos gráficos de infecções, mantendo o número de doentes que precisam de atendimento médico inferior à capacidade total da emergência dos hospitais.

Mas com o número de mortos crescendo no mundo inteiro, é natural que os brasileiros se perguntem: Quantos vão morrer no Brasil?

Foi tentando responder esta indagação que o Doutor em Astrofísica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, José Dias do Nascimento Júnior, junto com o professor doutor Wladimir Lyra, da Universidade do Estado do Novo Máximo, desenvolveram um modelo matemático, em linguagem Python, que julgam ser capaz de prever o tamanho do estrago do coronavírus em território brasileiro.

O modelo de Nascimento e Lyra divide a população brasileira em algumas categorias:

  • suscetíveis
  • infectados
  • curados
  • mortos

Estas categorias, dentro da pesquisa, interagem entre si de formas pré-determinadas. Os suscetíveis, quando entram em contato com os infectados, possuem uma chance de serem removidos da sua categoria original e serem incluídos a partir de então no grupo dos infectados.

Já entre os infectados, ao longo do tempo uma parcela destes é considerada curada, deixando de integrar este grupo e passando para a categoria de curados. Outra parcela, por sua vez, morre por conta da doença, e são removidos da categoria de infectados e incluídos na ala de “mortos”.

O modelo também leva em conta o fato de que, assim que são considerados curados, os pacientes não podem voltar para a categoria de suscetíveis, uma vez que desenvolvem imunidade à doença. Junto com os mortos, os curados são “removidos” da pandemia, o que explica o nome do modelo desenvolvido: “SIR (Suscetíveis-Infectados-Removidos)”. Na prática, todas essas regras são matematizadas a partir de equações criadas com base nas estatísticas atuais da Covid-19 no mundo inteiro, criando um modelo matemático capaz de prever o que vai acontecer no nosso país nas próximas semanas, ou meses.

VEJA TAMBÉM:
Além do Ozempic: novos medicamentos para perda de peso serão mais baratos e eficazes

Em conversa com o portal ‘Tecmundo‘, Lyra explicou a forma como ele imagina que essa epidemia pode terminar: “A primeira (forma) é quando muitas pessoas foram infectadas e desenvolveram imunidade ao se curar. Quando isso acontece não há mais pessoas suscetíveis e, portanto, não há novas infecções possíveis. Obviamente esse caso é terrível, pois toda a população teria sido infectada em algum momento durante a epidemia e o número de mortos pode ser assustador. A segunda maneira de terminar a epidemia é quando a taxa de infecção é menor que a taxa de remissão, e então o surto é contido. A quarentena (ou vacina) funciona por diminuir a taxa de infecção. O tratamento funciona para aumentar a taxa de remissão. Sem tratamento ou vacina, temos apenas a quarentena como medida eficaz”, explicou.

Resultados da pesquisa

Ao passo em que as estatísticas atuais dão conta de que na Itália cada pessoa infectada transmite o vírus para 3 ou 4 pessoas, no Brasil os pesquisadores entendem que cada infectado está expondo seis pessoas à doença. Por isso, o número de casos poderia dobrar a cada 2-3 dias. “Se continuar desta forma, sem fazermos nada, a epidemia vai ter o seu pico daqui a 50 dias, no começo de maio, com 53% da população infectada ao mesmo tempo. Isso são mais de 100 milhões de casos. Os hospitais não têm capacidade de lidar com esse número. E, ao final da epidemia, teríamos 2 milhões de mortos”, disse Lyra.

Mistérios do Mundo
Gráfico presente no modelo desenvolvido por José Dias do Nascimento e Wladimir Lyra.

Os pesquisadores alertam a população que, caso as pessoas não sigam à risca as medidas anunciadas pelos órgãos de saúde, como a quarentena voluntário e o distanciamento social, há uma grande chance do modelo acabar se concretizando. Para se ter uma ideia, a projeção foi capaz de acertar com precisão a data da primeira morte por Covid-19 no Brasil. Em 16 de março, data da publicação do estudo, os cientistas previam que a primeira morte aconteceria nos próximos cinco dias. Na manhã do dia 17, a cidade de São Paulo anunciava a primeira morte por coronavírus em território nacional.

VEJA TAMBÉM:
Avós que cuidam de seus netos vivem mais tempo, segundo a ciência

“Sem tratamento ou vacina, a única forma desta epidemia parar naturalmente é ela correr seu curso, infectando centenas de milhões e matando milhões de pessoas. O modelo prevê dois milhões de mortos no Brasil se não fizermos nada. Para evitar isso a população tem que parar de sair de casa, praticar distanciamento social. Apenas isso vai evitar o contágio”, alerta Lyra.

Vale ressaltar, como os próprios pesquisadores fazem questão de deixar claro na pesquisa, que eles não são epidemiólogos, e sim astrônomos, astrofísicos e especialistas da área matemática. No entanto, de acordo com eles, em momentos de crise como este em que vivemos, a ciência deve ser uma unidade, e nada pode ser excluído do processo de tomada de decisões.

“Estamos passando por um período cíclico de problemas. Isso vai do aquecimento global até as grandes epidemias. Estamos hoje fazendo uma ciência globalizada, onde parâmetros não podem ser tratados como sistemas simples. O próprio planeta que vivemos e sua população humana é completamente conectado em um grande sistema complexo”, afirmou Nascimento, que concorda que muitas perguntas continuam em aberto, mas afirma que a ciência é a ‘bússola’ para nos proteger em situações como essa.

“As abordagens analíticas para estudar e modelar a natureza sistêmica da disseminação de uma doença infecciosa é um belo exemplo de como a ciência opera. […]. Sem dúvida acredito que trabalhos como esse devem ser parte dos esforços colocados nas políticas de saúde pública. Apesar de muitas questões terem sido respondidas, muitas outras permanecem em aberto, porém a ciência é sempre a bússola necessária para a proteção nestes casos”, conclui Nascimento.

Photo of author
Leonardo Ambrosio tem 26 anos, é jornalista, vive em Capão da Canoa/RS e trabalha como redator em diversos projetos envolvendo ciências, tecnologia e curiosidades desde 2014.