Nas cozinhas brasileiras, as colheres de madeira são quase uma tradição. Presentes em receitas de família e no preparo diário de refeições, esses utensílios conquistaram espaço pela durabilidade e aspecto rústico. Mas o que muitos não sabem é que, por trás da aparência inocente, elas podem esconder riscos à saúde.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já proibiu seu uso em restaurantes e estabelecimentos comerciais, e especialistas alertam: o perigo também existe dentro de casa.
A madeira, material natural e poroso, funciona como um esconderijo ideal para microrganismos. Segundo Maria Cláudia da Silva, professora de Nutrição do Centro Universitário de Brasília (CEUB), os poros do utensílio acumulam restos de alimentos e umidade, criando um ambiente perfeito para bactérias e fungos se multiplicarem. “A estrutura irregular dificulta a limpeza completa. Mesmo após lavar, partículas microscópicas ficam retidas, servindo de alimento para colônias de microrganismos”, explica.
Essas colônias, conhecidas como biofilmes, são uma das principais ameaças. Elas se formam quando bactérias se agrupam e aderem à superfície, criando uma espécie de película resistente. O problema é que esses biofilmes não são eliminados com água e sabão, e podem transferir micróbios para outros alimentos ou superfícies durante o preparo das refeições. Esse processo, chamado contaminação cruzada, é uma das causas mais comuns de intoxicações alimentares. Dados de pesquisas indicam que a manipulação em superfícies inadequadas está diretamente ligada a surtos de doenças transmitidas por alimentos.
Além dos riscos biológicos, há o perigo físico. Com o uso constante, a madeira perde sua integridade: lascas e rachaduras podem se soltar e acabar misturadas à comida. Se ingeridas, essas partículas pontiagudas podem machucar a boca, a garganta ou até o trato digestivo. Manchas escuras, sinais de mofo, também são um alerta vermelho. “Quando o utensílio apresenta qualquer deformação ou alteração na cor, é sinal de que está comprometido e precisa ser substituído”, reforça a especialista.
Para evitar esses problemas, a alternativa está em materiais menos porosos. Colheres de aço inoxidável ou plástico de qualidade alimentar são recomendadas por sua superfície lisa, que facilita a higienização. “Esses materiais não absorvem resíduos e podem ser lavados com água quente e sabão sem sofrer danos”, destaca Maria Cláudia. A limpeza eficaz exige duas etapas: primeiro, remover a sujeira visível com detergente neutro; depois, desinfetar com água fervente ou soluções específicas para eliminar micróbios.
A professora também ressalta que a substituição periódica dos utensílios é essencial. Mesmo itens de metal ou plástico devem ser descartados se apresentarem fissuras, bordas afiadas ou desgaste excessivo. No caso das colheres de madeira, porém, o cuidado precisa ser redobrado. “O ideal é evitar seu uso doméstico, seguindo a mesma lógica aplicada em cozinhas profissionais. A segurança alimentar deve vir em primeiro lugar”, conclui.
Enquanto muitas famílias ainda resistem em abrir mão do charme das colheres de madeira, a ciência mostra que pequenas mudanças podem fazer grande diferença na prevenção de problemas de saúde. Escolher materiais adequados e adotar práticas rigorosas de higiene são passos simples para transformar a cozinha em um ambiente mais seguro.