Na cidade de Waterbury, Connecticut (EUA), um homem de 32 anos foi resgatado no fim de fevereiro após passar mais de duas décadas preso em um pequeno cômodo. O caso, que chocou a comunidade local, ganhou destaque após o envolvimento de bombeiros e a prisão de Kimberly Sullivan, madrasta da vítima, acusada de crimes como sequestro, prisão ilegal e crueldade.
Tudo começou quando os bombeiros foram chamados para controlar um incêndio em uma residência. Ao chegarem, encontraram o homem em estado grave de desnutrição, com marcas de negligência física e dental. Segundo relatos, ele ateou fogo no local como último recurso para chamar atenção e escapar do cativeiro. O quarto onde estava confinado media aproximadamente 3 metros quadrados e tinha uma fechadura externa no formato de trinco, instalada para impedir sua saída.
De acordo com o depoimento da vítima, ele foi trancado pela madrasta aos 11 anos de idade e, desde então, vivia em condições extremas. Durante todo o período, recebia apenas dois sanduíches e cerca de 480 ml de água por dia — quantidade insuficiente para um adulto, segundo especialistas. Suas únicas saídas do cômodo eram para realizar tarefas domésticas na casa de Sullivan. O homem também afirmou que não recebeu qualquer tipo de assistência médica ou odontológica nas últimas duas décadas.
Falha no sistema de proteção

Sullivan foi acusada (Departamento de Polícia de Waterbury)
A história revela ainda uma série de falhas nas denúncias feitas por funcionários da escola onde o menino estudou. Tom Pannone, ex-diretor da instituição, contou à imprensa que a criança já apresentava sinais de abuso desde os 5 anos. Na época, ele chegou a acionar repetidas vezes o serviço de proteção infantil, mas nenhuma medida foi tomada. “Todos sabiam que algo estava errado. Ele simplesmente desapareceu aos 10 anos, e ninguém investigou”, desabafou Pannone em entrevista.
A justificativa dada às autoridades educacionais foi de que o garoto havia sido transferido para outra escola e, posteriormente, estaria em regime de ensino domiciliar. Nenhuma verificação formal, porém, foi realizada para confirmar a situação.
Vizinhos surpresos e revolta das autoridades
Moradores da região relataram à imprensa que quase nunca viram o homem — algo que agora os deixa perplexos. “Deve tê-lo visto três vezes do lado de fora em todos esses anos. Lembro do rosto dele, mas nunca imaginamos o que acontecia aqui”, disse uma vizinha. Outro residente afirmou nunca ter ouvido falar da existência de um enteado na casa de Sullivan.
O chefe de polícia local, Fernando Spagnolo, classificou o caso como “doloroso e inimaginável”, destacando a longa duração do sofrimento da vítima. O homem, que não teve a identidade revelada, está em tratamento médico em uma unidade especializada, onde recebe cuidados para recuperar o peso e a saúde física.

Bombeiros foram chamados à casa em Connecticut (CBS)
A defesa de Kimberly Sullivan
Enquanto isso, a acusada enfrenta uma série de processos judiciais. Seu advogado, Ioannis Kaloidis, defendeu publicamente a cliente, alegando que as acusações são exageradas. “Ela não é a vilã que pintaram. Não havia tranca no quarto, ele não estava preso. Ela deu comida e abrigo”, afirmou Kaloidis em entrevista. A alegação contrasta com as evidências encontradas pela polícia, incluindo a fechadura externa no cômodo.
Kimberly Sullivan, que já está sob custódia, deve retornar ao tribunal no final de março para responder a crimes que podem resultar em décadas de prisão. Enquanto a Justiça segue seu curso, o caso reacende debates sobre a eficácia dos sistemas de proteção a crianças e a responsabilidade de vizinhos e instituições em denunciar situações suspeitas.
O resgate do homem expõe não apenas um crime chocante, mas também falhas estruturais que permitiram que a situação se prolongasse por mais de 20 anos. A polícia continua investigando se outras pessoas tinham conhecimento das condições do cativeiro ou participaram diretamente do caso.