Mulher com ‘superpoder’ raro que cheirou doença do marido 12 anos antes agora está ajudando cientistas a desenvolver teste Mulher com 'superpoder' raro que cheirou doença do marido 12 anos antes agora está ajudando cientistas a desenvolver teste

por Lucas Rabello
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Em um mundo onde os sentidos humanos são frequentemente subestimados, a história de Joy Milne, uma escocesa com um olfato fora do comum, está revolucionando a medicina. Ela não só detectou uma mudança no cheiro de seu marido mais de uma década antes de ele desenvolver sintomas de Parkinson, como também está ajudando cientistas a criar um método inovador para diagnosticar a doença precocemente.

A doença de Parkinson é um distúrbio neurodegenerativo que afeta gradualmente o sistema nervoso, provocando tremores involuntários, rigidez muscular e lentidão de movimentos.

Atualmente, não existe um exame específico para identificá-la: o diagnóstico depende da avaliação clínica, histórico familiar e exames neurológicos. Por isso, a descoberta de marcadores biológicos confiáveis é um desafio crucial para a ciência.

Joy Milne tem a capacidade única de sentir o cheiro da doença de Parkinson (BBC)

Joy Milne tem a capacidade única de sentir o cheiro da doença de Parkinson (BBC)

Tudo começou em 1982, quando Joy percebeu um aroma diferente em Les, seu marido, então com 32 anos. O odor, descrito como “musculoso e úmido”, persistia mesmo após banhos. Inicialmente, ela atribuiu o cheiro ao ambiente hospitalar onde ele trabalhava, mas anos depois, ao participar de um grupo de apoio a pacientes com Parkinson, Joy reconheceu o mesmo aroma em outras pessoas. Foi quando entendeu que aquela mudança olfativa estava ligada à doença.

Les só foi diagnosticado com Parkinson em 1994, 12 anos após os primeiros sinais percebidos por Joy. A descoberta tardia motivou o casal a buscar respostas.

Após a morte de Les em 2015, Joy manteve a promessa de continuar colaborando com pesquisadores. Em laboratórios, ela analisou camisetas de pacientes e amostras de sebo — uma substância oleosa produzida pela pele, que altera sua composição química em portadores de Parkinson.

O marido de Joy, Les, morreu em 2015 aos 65 anos (BBC)

O marido de Joy, Les, morreu em 2015 aos 65 anos (BBC)

Essas observações inspiraram uma equipe da Universidade de Manchester, no Reino Unido, a desenvolver um teste de swab cutâneo. O método, que analisa o sebo para identificar compostos associados à doença, alcançou 95% de precisão em condições laboratoriais. Os cientistas identificaram mais de 500 moléculas diferentes entre pessoas com e sem Parkinson, abrindo caminho para um diagnóstico precoce e não invasivo.

A professora Perdita Barran, líder da pesquisa, explica que o próximo passo é adaptar o teste para uso em hospitais. “Estamos trabalhando para que, dentro de dois anos, possamos iniciar exames na região de Manchester”, afirma. A expectativa é que, no futuro, uma simples amostra de pele possa detectar a doença anos antes dos primeiros sintomas.

Para Joy, um diagnóstico antecipado teria transformado a vida de sua família. “Teríamos viajado mais, aproveitado momentos juntos. Talvez até entendido melhor as mudanças de humor e a depressão que precederam os sintomas físicos”, reflete. Sua jornada ilustra como a combinação entre intuição humana e avanço científico pode salvar vidas.

Enquanto o teste não chega aos consultórios, a história de Joy permanece como um exemplo de como habilidades aparentemente comuns — como o olfato — podem esconder potenciais extraordinários. E, quem sabe, inspirar novas formas de enxergar (ou cheirar) os mistérios do corpo humano.

Fundador do portal Mistérios do Mundo (2011). Escritor de ciência, mas cobrindo uma ampla variedade de assuntos. Ganhou o prêmio influenciador digital na categoria curiosidades.