Ao contrário de outros mamíferos, os seres humanos não se desenvolveram de forma a se dar muito bem com a água. Por isso, não suportamos muito tempo submersos, já que nosso corpo exige um fornecimento constante de oxigênio.
Mesmo assim, algumas pessoas conseguem prender a respiração e mergulhar por alguns minutos. Porém, um grupo de nômades da Ásia parece ter desenvolvido uma “vantagem” genética em relação aos outros seres humanos quando o assunto é a capacidade de mergulhar por períodos prolongados.
Normalmente, quando você segura a respiração e mergulha seu rosto na água – seja em um banheira, em uma piscina ou mesmo no mar -, o seu corpo reage de várias formas diferentes. A sua frequência cardíaca tende a diminuir, seus vasos sanguíneos ficam mais comprimidos e o seu baço se contrai. Todas essas reações, somadas, fazem com que você gaste menos energia, o que é benéfico em situações de pouco suprimento de oxigênio.

E ao que tudo indica, o corpo do grupo de nômades conhecido como ‘Bajau’, que vive nas Filipinas, na Malásia e na Indonésia, evoluiu de forma a usufruir melhor desses benefícios. Um estudo publicado na revista ‘Cell’ revela que uma mutação genética no corpo desses indivíduos faz com que o o baço dos ‘Bajau’ seja maior do que o padrão, constituindo uma vantagem genética para viver nas profundezas.
Isso é importante para este povo, já que a prática do mergulho é crucial para eles, tanto para a pesca quanto para a coleta de materiais utilizados para fabricação de produtos artesanais.
Outras pesquisas, realizadas anteriormente, já haviam mostrado que os baços de mamíferos marinhos que passam grande parte da vida debaixo d’água, como as focas, são muito maiores que o normal. A autora do novo estudo, Melissa Llardo, do Centro de Geogenética da Universidade de Copenhague, quis testar se isso também se aplicava a seres humanos.
“Eu queria primeiro conhecer a comunidade, e não apenas aparecer lá com equipamentos científicos e depois sair. Na segunda visita, trouxa uma máquina de ultrassom portátil e kits de coleta. Fomos a casas diferentes e fizemos imagens dos baços deles”, explicou a pesquisadora, que diz que o povo local ficou espantado, porém alegre em saber que ela havia se interessado em conhecê-los.

Para efeitos de comparação, a equipe também coletou dados de outro grupo de indivíduos, conhecidos como ‘Saluan’, que vivem na região da Indonésia. Ao analisar os resultados, os pesquisadores perceberam que o tamanho médio do baço de um indivíduo ‘Bajau’ era 50% maior que o de um indivíduo ‘Saluan’.
Os cientistas também se depararam com um gene chamado PDE10A, que ao que tudo indica é responsável por controlar um hormônio da tireoide, no corpo dos Bajau, mas não no dos Saluan. Os pesquisadores relatam, no estudo, que em camundongos este hormônio costuma estar associado ao tamanho do baço, já que os ratos que são geneticamente manipulados para ter menores quantidades deste hormônio possuem, também, baços menores.

As descobertas, ainda que sejam bastante interessantes, precisam ser complementadas por novos estudos, que devem ser realizados em seguida.
Segundo Llardo, as conclusões do seu estudo também possuem implicações médicas. Ela explica que a resposta que o nosso corpo tem ao ato de mergulhar é semelhante a uma condição médica chamada ‘hipóxia aguda’, em que os pacientes experimentam uma rápida perda de oxigênio. Essa condição costuma dar bastante dor de cabeça nas salas de emergência, e estudar os Bajau pode ser útil para compreender a hipóxia.

Infelizmente, este povo que historicamente tem uma forte ligação com o mar, está sendo cada vez mais afastado das águas. Isso porque eles são considerados grupos marginalizados, sem os mesmos direitos de outros povos dentro do seu país. Além disso, o aumento da pesca industrial também dificulta a alimentação destes indivíduos, que dependem dos peixes para sobreviver.