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Escafismo, o macabro método de tortura utilizado na Pérsia

Leonardo Ambrosio

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escafismo
O escafismo foi criado pelo Império Persa, e consistia em colocar a vítima presa em dois grandes troncos, ou barcos.

A história da humanidade está marcada por inúmeras passagens tristes e lamentáveis, e se ainda nos dias de hoje podemos ver coisas terríveis acontecendo no mundo inteiro, o passado com certeza era ainda mais tenebroso. Hoje em dia, a pena de morte e a tortura são condenadas em praticamente todos os países, salvo poucas exceções. Mas antigamente, muitas pessoas morriam de formas terríveis para pagar por seus crimes. E talvez uma das formas de execução mais bizarras e assustadoras que já existiu foi o escafismo.

Esta técnica de execução foi desenvolvida em meados do ano 500 a.C, pelo Império Persa, e consistia em colocar a vítima presa em dois grandes troncos, ou barcos.

A pessoa era posicionada com a cabeça para fora, e o resto do corpo preso na parte de dentro dos troncos ou do barco. A vítima, a partir daí, era forçada a ingerir grandes quantidades de mel e leite, o que invariavelmente fazia com que ela desenvolvesse uma severa diarreia.

Aos poucos, as fezes iam preenchendo o barco, e em pouco tempo a vítima já estava totalmente coberta por fezes, leite e mel. Como você pode imaginar, o cenário se tornava muito propício às infestações de vermes e insetos, que eram atraídos pelo mel e por toda a sujeira acumulada, e acabavam também comendo a vítima ainda viva, sem que ela pudesse fazer nada para se defender.

As origens do escafismo

Plutarco, na esquerda, e Artaxerxes II, na direita.
Plutarco, na esquerda, e Artaxerxes II, na direita.

Em primeiro lugar, é importante ressaltar que não existem provas confiáveis de que o escafismo foi realmente utilizado em algum momento da história. O conceito do escafismo vem das obras do filósofo Plutarco, que citou esta técnica em alguns dos seus textos.

Em uma passagem, Plutarco diz ter visto tal execução depois que um soldado chamado Mitrídates matou Ciro, o Jovem, irmão do rei Artaxerxes II. Ainda que Mitrídates tenha impedido Ciro de derrubar o rei – algo que agradou Artaxerxes -, o rei exigiu que ele mantivesse isso em segredo, dizendo a todos que Ciro havia sido assassinado pelo próprio rei.

O problema é que, de acordo com os relatos de Plutarco, Mitrídates esqueceu do combinado durante um banquete, onde ele bebeu além da conta e começou a gabar-se por ter tirado a vida de Ciro. Como não poderia ser diferente, Artaxerxes II foi informado do deslize mortal de Mitrídates, que acabou sendo condenado a morrer por escafismo para pagar por sua traição.

A exigência do rei era de que o homem sofresse e morresse lentamente. Segundo os relatos, ele teria sobrevivido por 17 dias preso ao barco. É nesse texto que Plutarco dá alguns detalhes sobre a técnica do escafismo: “Dois barcos são emoldurados de forma a encaixar um ao outro.

Então, o malfeitor é deitado em um deles, de costas. Então, um dos barcos cobre o outro, deixando a cabeça, as mãos e os pés do lado de fora, e o resto do corpo na parte de dentro. Os torturadores ofereciam comida à vítima, que quando se recusava tinha seus olhos fincados até ceder. Então, depois de ingerirem o alimento, eles eram encharcados com uma mistura de leite e mel”, descreve Plutarco.

Plutarco detalhava como a mistura também era derramada no rosto da vítima, que queimava no sol enquanto a tortura se arrastava por longos dias. Inicialmente, apenas as moscas eram atraídas até a vítima, mas com o passar do tempo chegavam os vermes, que rastejavam por todos os orifícios.

“Quando o homem estava morto, o barco mais alto era retirado, e a vítima encontrava-se com a carne devorada por enxames de criaturas nojentas que, por assim dizer, cresciam em suas entranhas”, escreveu Plutarco. “Dessa forma, Mitrídates, depois de sofrer por 17 dias, finalmente morreu”.

A morte “pelos barcos”

Joannes Zonaras detalhou ainda mais os horrores do escafismo lá no século XII. Ainda que Zonaras tenha baseado suas observações nos textos de Plutarco, o cronista bizantino opinou que os antigos persas “superam todos os outros bárbaros na horrível crueldade de suas punições”.

Zonaras também escreveu que os barcos eram firmemente pregados, para garantir que não houvesse fuga. “Em seguida, eles despejavam uma mistura de leite e mel na boca da vítima, até que ela vomitasse”, escreveu o bizantino.

“Isso era repetido todos os dias, e como resultado eram atraídas moscas, vespas e abelhas, que pousavam no rosto da vítima, causando muito incômodo e dor, por conta das picadas. Além disso, o estômago irritado pelo leite e pelo mel, produzia excrementos líquidos, e isso atraía enxames putrefatos de vermes de todos os tipos”.

E como se tudo já não fosse suficientemente terrível, os carrascos supostamente derramavam mais leite e mel nos órgãos genitais do prisioneiro. Por conta disso, pequenos insetos migravam para essas áreas para se alimentar, causando infecções sérias. Essas feridas invariavelmente começariam a vazar pus, estimulando a chegada de larvas, que se reproduziam dentro do corpo enquanto causavam ainda mais doenças. Era nesse ponto que vermes como ratos chegavam para roer a pele e a carne da vítima moribunda.

Mas, no fim das contas, o escafismo existiu mesmo?

Muitas pessoas acreditam de que o escafismo era realmente um método de execução bastante utilizado na antiga Pérsia, mas defendem que essa técnica só era aplicada aos criminosos mais “desprezíveis” – desde traidores da coroa até assassinos implacáveis. Mas nem todos os estudiosos do assunto estão tão convencidos.

Muitos historiadores sugerem que a prática não passa de uma lenda, já que a primeira menção histórica desse ato medonho surgiu séculos após a suposta execução de Mitrídates. Além disso, esse relato foi testemunhado por um filósofo conhecido por suas prosas e textos fantasiosos.

No entanto, para os mais céticos, o escafismo foi certamente uma invenção literária dos gregos antigos, que conhecidamente eram muito criativos. No entanto, Artaxerxes II, Mitrídates e Ciro, o Jovem, eram figuras reais da história antiga. Além disso, nos séculos seguintes vários métodos de tortura tão cruéis ou ainda mais violentos do que o escafismo surgiram no mundo inteiro. Neste sentido, é certamente plausível que essas execuções tenham sido reais.

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Leonardo Ambrosio tem 26 anos, é jornalista, vive em Capão da Canoa/RS e trabalha como redator em diversos projetos envolvendo ciências, tecnologia e curiosidades desde 2014.