Efeitos colaterais horríveis que um homem experimentou após 86 minutos na sala mais silenciosa do mundo

por Lucas Rabello
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Imagine um lugar onde o som da sua respiração parece alto como um trovão, onde cada batida do coração ecoa como um tambor e o fluxo do sangue nas veias se transforma em um ruído constante. Esse lugar existe: é a Câmara Anecoica da Universidade South Bank, em Londres, considerada um dos ambientes mais silenciosos do planeta. Mas, ao contrário do que muitos pensam, a experiência de ficar lá dentro não é relaxante — é perturbadora.

A câmara foi projetada para eliminar quase completamente qualquer som externo e interno. As paredes são revestidas com materiais que absorvem ondas sonoras, evitando reflexões. O resultado é um silêncio tão intenso que o ambiente atinge níveis abaixo de 25 decibéis — equivalente ao som de uma respiração suave. Para comparação, uma biblioteca silenciosa gira em torno de 40 decibéis. Nesse vácuo acústico, até os menores ruídos do corpo humano se tornam amplificados. Quem entra lá ouve não só o estômago roncando ou as articulações estalando, mas também o sangue circulando pelas veias.

Em 2019, o youtuber Callum McGinley, conhecido como Callux, decidiu enfrentar esse silêncio extremo. Seu objetivo era quebrar o recorde mundial do Guinness de permanência na câmara, que era de 67 minutos. A regra era clara: ele precisava ficar acordado, consciente e só podia falar por 60 segundos a cada cinco minutos, para não ultrapassar os 25 decibéis.

Os Efeitos de um Silêncio Insuportável

Logo nos primeiros minutos, Callum descreveu uma sensação de “flutuar no espaço”. Em cinco minutos, um zumbido agudo (tinnitus) tomou conta de seus ouvidos. Aos 15 minutos, ele já relatava pressão na cabeça e via luzes dançando no escuro — alucinações provocadas pela falta de estímulos sensoriais.

A Câmara Anecoica da Universidade South Bank é composta por paredes grossas de concreto, cunhas longas de espuma e portas à prova de som (YouTube/Callux).

A Câmara Anecoica da Universidade South Bank é composta por paredes grossas de concreto, cunhas longas de espuma e portas à prova de som (YouTube/Callux).

Aos 30 minutos, o youtuber percebeu que o som que imaginava ser o metrô de Londres era, na verdade, seu próprio sangue correndo pelas veias. “Parece que alguém arrasta um carrinho pelo meu ouvido”, descreveu. O desconforto aumentou: o tempo parecia passar mais devagar, e cada segundo se arrastava.

Aos 45 minutos, Callum enfrentou o pior momento. Alucinações visuais e auditivas se intensificaram. Ele tentou “seguir” uma figura imaginária que via se movendo pela sala, mas a experiência o assustou a ponto de trazer lágrimas aos olhos. “Fiquei com medo de perder a sanidade”, confessou. Mesmo assim, resistiu até completar 1 hora e 26 minutos — um novo recorde.

Por que o Silêncio Absoluto é tão Perturbador?

Steven Orfield, designer da câmara anecoica da Orfield Laboratories (Minnesota, EUA), explica que, na ausência de sons externos, o cérebro passa a focar nos ruídos internos do corpo. “Você se torna o som”, diz ele. Em ambientes comuns, nosso ouvido se adapta a níveis de ruído, mas no vácuo acústico, até o bater do coração vira uma distração.

A Universidade South Bank ressalta que a câmara foi construída para estudos acústicos, como testar equipamentos de áudio ou analisar reações humanas ao silêncio. Porém, até os engenheiros evitam ficar lá por mais de 40 minutos. Orfield recomenda no máximo 45 minutos: após esse tempo, a maioria das pessoas começa a sentir desconforto físico e mental.

Um Desafio para Corajosos

Apesar dos efeitos assustadores, a câmara de Londres não é a única do tipo. A versão norte-americana, em Minneapolis, também atrai curiosos dispostos a encarar o silêncio absoluto. O desafio de Callum inspirou muitos, mas poucos se arriscam a superar sua marca.

Para quem pensa em tentar, é preciso preparo psicológico. O cérebro humano não está acostumado à ausência total de estímulos. Em um mundo repleto de barulho, o silêncio extremo vira uma experiência sensorial avassaladora. Alguns visitantes relatam náuseas, outros perdem a noção de equilíbrio — já que o ouvido interno, responsável pela orientação espacial, fica “confuso” sem referências sonoras.

Como Funciona a Câmara Anecoica?

O segredo do silêncio está no design. As paredes são cobertas por cunhas de fibra de vidro e espuma, que absorvem 99,9% das ondas sonoras. O piso é uma grade suspensa, isolando o visitante de vibrações. Não há janelas, e a porta é uma pesada estrutura à prova de som. Tudo para criar um ambiente onde o único ruído é o do próprio corpo.

Curiosamente, o silêncio absoluto não é totalmente possível. Mesmo no vácuo, moléculas de ar se movem e produzem algum som, mas o ouvido humano não consegue detectá-lo. Por isso, tecnicamente, a câmara não chega a zero decibéis — o limite físico do silêncio.

Um Recorde que Pode ser Quebrado

Callum McGinley provou que é possível resistir por mais de uma hora, mas sua experiência não foi nada fácil. Ele descreveu a última parte do desafio como “a mais difícil da minha vida”. Se você acha que tem estômago para encarar, as câmaras de Londres e Minneapolis estão de portas abertas. Basta coragem — e talvez uns protetores auriculares… mesmo que, ironicamente, eles não façam diferença nenhuma em um lugar onde o maior inimigo é o seu próprio corpo.

Enquanto isso, a Câmara Anecoica segue como um lembrete fascinante (e um pouco aterrador) de como nosso cérebro depende do som para se manter estável. Quem sabe o próximo recordista não será você?

Lucas Rabello
Lucas Rabello

Fundador do portal Mistérios do Mundo (2011). Escritor de ciência, mas cobrindo uma ampla variedade de assuntos. Ganhou o prêmio influenciador digital na categoria curiosidades.

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