No início do século XX, o empresário americano Henry Ford era conhecido mundialmente por sua revolucionária linha de montagem e pela produção em massa do Modelo T, o primeiro automóvel acessível para a classe média. Entretanto, poucos sabem que Ford também tentou criar uma comunidade utópica na Amazônia brasileira, um projeto ambicioso que ficou conhecido como Fordlândia.
Esta história fascinante de visão, ambição e, por fim, fracasso, é um capítulo pouco conhecido da história industrial e um exemplo notável das complexidades envolvidas quando se tenta transplantar uma cultura para um ambiente totalmente diferente.
A visão de Ford e os primeiros passos de Fordlândia
Em 1927, Henry Ford enfrentava um problema crescente: o monopólio britânico sobre a produção de borracha, um componente essencial para a fabricação de pneus e outras peças de automóveis. Determinado a garantir um suprimento estável e barato de borracha para sua empresa, Ford voltou seus olhos para a Amazônia brasileira, o habitat natural da seringueira.
Com a aprovação do governo brasileiro, Ford adquiriu uma concessão de terra de cerca de 10.000 km² no estado do Pará, às margens do rio Tapajós. Seu plano era ambicioso: criar não apenas uma plantação de seringueiras, mas uma comunidade modelo que incorporasse os ideais americanos de trabalho duro, vida saudável e prosperidade. Ford acreditava que poderia replicar o sucesso de suas fábricas nos Estados Unidos, trazendo “civilização” para a selva amazônica.
A construção de Fordlândia começou em 1928. Rapidamente, uma cidade começou a surgir no meio da floresta tropical. Casas no estilo americano, com telhados de telhas vermelhas e varandas brancas, foram erguidas em ruas perfeitamente alinhadas. A cidade foi equipada com hospitais, escolas, lojas e até mesmo um campo de golfe. Ford estava determinado a criar um pedaço da América no coração da Amazônia.
Desafios e conflitos culturais
Apesar do otimismo inicial, Fordlândia logo começou a enfrentar uma série de desafios que expuseram as falhas fundamentais no plano de Ford. O primeiro e mais óbvio problema era o ambiente. As seringueiras, que na natureza crescem dispersas para evitar pragas, foram plantadas em fileiras ordenadas e próximas umas das outras, como em uma plantação tradicional. Isso criou condições ideais para a propagação de doenças e pragas, resultando em safras fracas e árvores doentes.
Além disso, os administradores americanos enviados para gerenciar o projeto tinham pouco ou nenhum conhecimento sobre agricultura tropical ou sobre a cultura local. Eles tentaram impor o estilo de vida e os valores americanos aos trabalhadores brasileiros, muitos dos quais eram indígenas ou caboclos acostumados a um ritmo de vida muito diferente.
O cardápio do refeitório, por exemplo, era composto por alimentos típicos americanos, como hambúrgueres e conservas, que eram estranhos e pouco apetitosos para os trabalhadores locais. A proibição de álcool e a imposição de horários rígidos de trabalho também causaram ressentimento. As tensões culturais chegaram ao auge em 1930, quando uma revolta dos trabalhadores levou à destruição de parte das instalações e à fuga dos administradores americanos.
Esses conflitos revelaram uma falha fundamental na visão de Ford: a crença de que os métodos e valores que funcionavam em Detroit poderiam ser simplesmente transplantados para a Amazônia, sem considerar as diferenças culturais e ambientais.
O destino de Fordlândia
Apesar dos esforços contínuos para superar os desafios, Fordlândia nunca se tornou o sucesso que Henry Ford imaginava. A produção de borracha nunca atingiu níveis significativos, e o projeto continuou a drenar recursos da Ford Motor Company. Em 1945, com o desenvolvimento da borracha sintética durante a Segunda Guerra Mundial tornando o projeto ainda menos viável economicamente, Fordlândia foi finalmente abandonada.
Hoje, Fordlândia permanece como uma cidade fantasma na floresta amazônica, com ruínas de casas em estilo americano deterioradas e maquinário enferrujado.