O desastre nuclear ocorrido em Chernobyl no ano de 1986 voltou a fazer manchetes principalmente após o sucesso da série da HBO abordando o tema.
Talvez alguns não se lembrem, no entanto, que o Brasil também viveu um desastre envolvendo problemas relacionados à contaminação por radioatividade, apenas um ano depois da explosão na planta nuclear localizada no território que hoje pertence à Ucrânia. [5 coisas estranhas que você provavelmente não sabe sobre Chernobyl]
Em 1987, na cidade de Goiânia, catadores de lixo encontraram um objeto que lhes chamou atenção, em um primeiro momento, dentro de um ferro-velho. Tratava-se de uma máquina de tratamento para pessoas com câncer, que guardava dentro de si uma quantidade considerável de cloreto de césio, também conhecido como césio-137.
Atraídos pela coloração e pela característica brilhosa do produto, que se apresenta em forma de um pó, os dois catadores que o encontraram acabaram por contaminar mais de 1000 pessoas na cidade, de forma totalmente não intencional.
Brasil também teve desastre radioativo, apenas um ano depois da explosão em Chernobyl. | Shutterstock
Após entrarem em contato com o césio-137, os dois catadores tornam-se os primeiros a demonstrar os sintomas da intoxicação pelo contato com substância radioativa, incluindo crises de diarreia, vômitos e uma forte náusea.
A contaminação em massa começou depois que a máquina (e a substância) fora repassada para um outro proprietário, que levou o material para sua casa, inclusive recebendo a visita de diversos vizinhos atraídos pela curiosidade. Um dos irmãos do novo proprietário da peça pegou uma parte do material para si, levando-a para sua casa e, posteriormente mostrando para sua família.
Sem que ele percebesse, uma parte do pó acabou por contaminar a comida de sua filha, de apenas 7 anos, chamada Leide das Neves. Cerca de um mês depois, Leide tornava-se a primeira vítima fatal do desastre envolvendo o césio-137.
Ferro-velho onde o césio-137 foi obtido no desmanche do aparelho de radioterapia. (Foto: Yoshikazu Maeda / Tecmundo)
Com o passar do tempo, a população percebeu que todos aqueles que haviam entrado em contato com a substância brilhosa estavam enfrentando os mesmos sintomas, e por conta disso o material fora levado para a Vigilância Sanitária.
Pouco tempo depois, o órgão confirmou que se tratava de substância radioativa, e infelizmente a esposa do proprietário da máquina, responsável por levar o material até a vigilância, tornou-se a segunda vítima fatal.
A Comissão Nacional de Energia Nuclear, depois disso, encarregou-se da descontaminação da cidade, monitorando ativamente mais de 100 mil pessoas, em especial as cerca de 130 que estavam em situação grave de contaminação.
Ao todo, foram confirmadas quatro mortes em decorrência da contaminação pelo césio-137, mas estima-se que o número seja muito maior, de acordo com a Associação de Vítimas do Césio-137.
Terreno onde ficava o ferro-velho onde a máquina foi encontrada. | Wikicommons
Até hoje, em Goiânia, muitos lembram com pesar dos ocorridos daquele ano. A Rua 57, localizada no centro da cidade, ficou marcada por ter abrigado a residência de um dos catadores responsáveis pelo começo da contaminação, que já fora demolida há algum tempo. Hoje, a única lembrança da tragédia de 1987 é o terreno da residência, e a memória que insiste em não sair da cabeça daqueles que perderam pessoas queridas ou de alguma outra forma foram afetados pelo desastre.
Terreno da casa onde vivia um dos catadores, onde a cápsula contendo o césio-137 foi aberta. | Domínio Público
Conhecido como “Acidente Radiológico de Goiânia”, o desastre fora classificado com nível 5 na Escala Internacional de Acidentes Nucleares, em uma avaliação que vai de 1 a 7.
Leonardo Ambrosio tem 26 anos, é jornalista, vive em Capão da Canoa/RS e trabalha como redator em diversos projetos envolvendo ciências, tecnologia e curiosidades desde 2014.