A produção de queijo é uma arte que evoluiu ao longo de milhares de anos, e hoje podemos dizer que existe uma infinidade de produtos diferentes, cada um com o seu próprio processo de fabricação. Normalmente, a iguaria precisa da atuação de várias bactérias até que chegue ao ponto ideal para o consumo. Mas também existem os queijos que apostam na ação dos fungos, como é o caso do gorgonzola e do roquefort. No entanto, definitivamente nada se compara ao método de produção do queijo casu marzu, tradicional da Sardenha, na Itália.
Estamos falando de uma das principais iguarias desta ilha italiana, que é visitada por turistas do mundo inteiro todos os anos. Quem já provou este queijo, jura que o seu sabor é tão extremo que pode ficar na boca até mesmo horas depois de ser engolido. O problema é que muitas pessoas sequer têm coragem de prová-lo, principalmente depois de ficarem sabendo dos detalhes sobre a sua produção.
Isso porque o casu marzu é preparado com a ajuda de larvas de mosca, o que é suficiente para fazer grande parte dos potenciais consumidores torcerem o nariz. Para outros, no entanto, isso só faz com que a iguaria seja ainda mais excêntrica e chamativa.
O casu marzu é um queijo que costuma ser servido ainda com as larvas misturadas ao produto, o que fez com que ele fosse proibido na Itália ainda em 1962.
A justificativa é simples: As autoridades italianas não aprovam a comercialização e o consumo de alimentos infestados com parasitas. Justo, não é mesmo? Aliás, a produção deste queijo é tão polêmica que, em 2009, o Guinness Book concedeu a esta iguaria o título de “queijo mais perigoso do mundo”.
O que acontece ao comer o casu marzu?
Suportar a ojeriza natural em relação a este produto é apenas uma etapa pela qual você precisa estar pronto para passar. Afinal de contas, ingerir larvas vivas pode ser extremamente perigoso para o nosso organismo.
Por isso, algumas pessoas que aceitam experimentar o casu marzu pedem para que ele seja passado por uma espécie de centrífuga antes do consumo, fazendo com que as larvas sejam trituradas e se misturem com o produto final. Há, entretanto, aqueles que querem ser mais “hardcore” em suas experiências, e optam por comer a iguaria com os vermes ainda vivos.
É claro que, durante a mastigação e o restante do processo digestivo, grande parte dos vermes (se não todos) morrem e são normalmente digeridos pelo corpo humano. Mas não é impossível que um ou dois vermes resistam aos ácidos estomacais, principalmente se forem engolidos sem a devida mastigação.
E nestes casos, os médicos dizem que não se pode descartar a possibilidade de microperfurações no intestino, bem como quadros de parasitismo generalizado. O Guinness Book é bem enfático na hora de citar alguns dos sintomas que você pode ter após ingerir o casu marzu, caso dê o azar de colocar algum verme vivo para dentro do seu corpo: “Vômitos, dor abdominal e diarreia sanguinolenta”.
Questão cultural?
Ainda que muitas pessoas tenham dificuldade em acreditar que os visitantes da Sardenha optem por livre e espontânea vontade a ingerir este alimento, o chef de cozinha Roberto Flore, que concedeu entrevista à CNN, garante que o alimento é seguro. “Como você define uma comida como comestível?
Cada região do mundo tem uma maneira diferente de comer insetos. […] Acredito que ninguém morreu comendo casu marzu até hoje. Se morreu, talvez estivesse bêbado. Sabe, quando você come, também bebe muito vinho”, argumentou o chef, que vive na Sardenha e possui intimidade com o prato “curioso”.
Por dentro da fabricação do casu marzu
Além das larvas, para fabricar um belo pedaço de queijo casu marzu você precisa ter em mãos alguns outros ingredientes. A iguaria é feita com base no leite cru de ovelha, que é processado até chegar em um tipo de queijo conhecido como “percorino sardo”. É a partir desta qualidade de queijo que o casu marzu é produzido.
Para tal, é preciso criar uma situação que favoreça a chegada das moscas. Os chefs especializados na produção desta iguaria são tão estudiosos do assunto que sabem até mesmo os meses em que as moscas estão mais ativas, e é por isso que normalmente os queijos são preparados ao final de junho, sendo que é preciso esperar até três meses para o alimento estar pronto para o consumo. As larvas, que nascem e crescem dentro do queijo, rastejam por todo o alimento durante suas vidas, conferindo a ela o seu famoso aspecto cremoso.
Um fato curioso é que os apreciadores do casu marzu dizem que ele só é próprio para o consumo enquanto as larvas estão vivas, uma vez que quando os vermes começam a morrer naturalmente o alimento é considerado “estragado”.
Tradição que desafia as autoridades
Como mencionamos anteriormente, o governo italiano não permite a comercialização do casu marzu, e descumprir esta determinação pode custar uma multa de quase 60 mil euros.
Mesmo assim, muitas famílias tradicionais da Sardenha continuam levando a tradição do queijo mais perigoso do mundo adiante. E o assunto já foi até mesmo levado aos laboratórios. Em 2005, especialistas da Universidade Sassari, da Sardenha, concluíram em um estudo que é possível produzir o casu marzu em laboratório, em condições controladas para garantir a segurança de quem está ingerindo o alimento.
De qualquer forma, o produto que para muitas pessoas é um dos mais nojentos do mundo continua sendo proibido e ilegal, mesmo no país onde ele foi inventado.
Portanto, se você tem vontade de experimentá-lo, vai precisar se esforçar para encontrar alguma família que continue produzindo o queijo de forma clandestina – o que não é assim tão raro na ilha da Sardenha. Obviamente, ao ingerir um produto ilegal, você está por sua própria conta e risco.