Nascimentos de gêmeos siameses são eventos raros. No Reino Unido, estima-se que ocorra um caso a cada 500 mil partos. Globalmente, os números variam ainda mais: entre um a cada 50 mil e 200 mil nascimentos. Esses casos acontecem quando um óvulo fertilizado não se divide completamente no início do desenvolvimento ou quando dois embriões se fundem.
Hoje, avanços na medicina permitem separar a maioria dos gêmeos siameses ou garantir que tenham qualidade de vida mesmo unidos. Mas, no passado, muitos enfrentaram realidades brutais, como a exploração em espetáculos de aberrações ou experimentos científicos. A história de Daisy e Violet Hilton, nascidas em Brighton em 1908, é um exemplo marcante.

Gêmeas siamesas, Daisy e Violet Hilton
As irmãs vieram ao mundo unidas pelo quadril, compartilhando partes do sistema circulatório. Logo após o nascimento, foram vendidas pela mãe biológica para Mary Hilton, uma mulher que enxergou nas meninas uma oportunidade de lucro. Antes mesmo de completarem três anos, Daisy e Violet já eram exibidas como atrações em bares e turnês. Mary as controlava com violência, obrigando-as a praticar música até se tornarem habilidosas no violino e no piano. A exploração era tão intensa que fotos das irmãs eram vendidas como souvenirs, e o público pagava para vê-las em apresentações humilhantes.
Quando Mary morreu, as gêmeas foram tratadas como propriedade: herdadas pela filha dela, Edith, que continuou a explorá-las. Anos se passaram até que, já adultas, conseguiram romper o “contrato” e conquistar independência. Livres, seguiram carreira no vaudeville — um tipo de teatro popular —, onde se apresentavam como músicas e atrizes. Em 1952, estrelaram o filme Chained for Life (Acorrentadas para a Vida), que abordava de forma fictícia a vida de gêmeas siamesas. A obra, porém, banalizava a complexidade de sua realidade, retratando sua condição quase como uma curiosidade cômica.

As duas eram talentosas
A carreira artística das irmãs terminou abruptamente em 1961, quando o vaudeville perdeu espaço para novas formas de entretenimento. Sem renda, aceitaram empregos num supermercado em Charlotte, Carolina do Norte, onde trabalharam por sete anos. A vida longe dos holofotes, porém, não as poupou de mais tragédia. Em janeiro de 1969, contraíram gripe durante uma epidemia local. Por estarem fisicamente conectadas, a doença se espalhou rapidamente entre as duas. Daisy foi a primeira a morrer, mas Violet resistiu por mais dois a quatro dias — períodos exatos variam conforme registros históricos.

Violet e Daisy Hilton em *Chained for Life* (Acorrentadas para a Vida), um filme que, desde então, tem sido criticado.
O destino final das irmãs carrega um detalhe macabro: Violet passou seus últimos dias de vida unida ao corpo em decomposição da irmã, já que a separação só seria possível com intervenção cirúrgica — algo inexistente na época. Hoje, médicos avaliam que, com a tecnologia atual, Daisy e Violet provavelmente poderiam ter sido separadas com segurança. Na primeira metade do século XX, porém, a medicina não oferecia essa possibilidade.
A trajetória das Hilton revela não só a resistência de duas mulheres frente à exploração, mas também os limites da ciência e da ética em um período em que “espetáculos de anomalias” ainda eram comuns. Suas vidas foram marcadas por talento, resistência e uma ligação física que, no fim, determinou até mesmo a maneira como partiram.