O mundo das runas, esses antigos alfabetos gravados na memória coletiva da humanidade, se estende pela fenda entre a realidade histórica e a grandeza mitológica. Originando-se lá atrás, no século 3 d.C., as runas ocuparam um espaço duplo, não apenas como letras comuns para comunicação mundana, mas como símbolos enigmáticos repletos de significado místico. Contudo, à medida que navegamos pelos tempo, descobrimos que a essência das runas está profundamente enraizada na cultura, espiritualidade e visão de mundo dos povos nórdicos.
Das Inscrições Práticas aos Símbolos Mágicos
Transitando de uma ferramenta prática para um símbolo de poder transcendental, as runas nos oferecem uma lente única para a civilização nórdica. Historicamente falando, o termo “runa” significa “segredo” ou “mistério”, capturando o senso de reverência e admiração com que esses símbolos eram tratados. Nascidas do Velho Futhark, um sistema de 24 letras divididas em três grupos conhecidos como aettir, as runas eram inicialmente um método direto de comunicação.
Serviam a necessidades práticas, como o registro de informações ou a inscrição de propriedades, não diferente dos alfabetos latino e grego. Mas, diferentemente de seus contrapartes mediterrâneos, as runas carregavam um ar de misticismo que transcendia sua utilidade pedestre.
Essa jornada transformadora de alfabetos cotidianos para símbolos mágicos pode ser rastreada até a crença profundamente enraizada dos vikings em um mundo repleto de forças espirituais. Imagine um nórdico navegante, gravando runas no casco de seu drakkar antes de uma expedição. O ato não era meramente simbólico; era uma invocação, uma maneira de acessar os poderes ocultos governados por Odin, o Pai de Todos na mitologia nórdica.
A lenda diz que o próprio Odin, em sua busca por sabedoria, pendurou-se em Yggdrasil— a árvore cósmica que sustenta todos os reinos— e recebeu o dom das runas. Nesse pano de fundo mítico, um viking inscrevendo runas não era apenas um escriba, mas um conjurador, mediando entre o humano e o divino.
Conforme os drakkares vikings navegavam cada vez mais longe, sua língua e suas runas se mutavam para se adequar a novas terras e novas línguas. O Velho Futhark se expandiu para o Futhark Anglo-Saxão nas Ilhas Britânicas e o Futhark Nórdico simplificou para 16 caracteres, testemunho do dinamismo linguístico desse povo nômade. Essa difusão levou à inscrição de milhares de pedras rúnicas e manuscritos encontrados principalmente na Escandinávia e na Grã-Bretanha, como a monumental Pedra de Rök na Suécia ou o Codex Runicus, que abriga a lei provincial nórdica mais antiga preservada.
A Fascinação Moderna e o Legado Duradouro das Runas
Uma curiosidade surge ao considerar a romantização moderna das runas. Após desaparecerem quase que completamente, esses símbolos tiveram um ressurgimento durante o período Romântico, quando o Ocidente se encantou com seu passado místico. E o fascínio persiste. Hoje, uma breve pesquisa online revelará uma infinidade de kits de adivinhação baseados em runas, livros e até mesmo videogames. Claramente, a magia das runas não se apagou, mas se transformou, adaptando-se às imaginações de cada geração sucessiva.
No entanto, para o verdadeiro buscador, o fascínio pelas runas vai além dos encantos superficiais da cultura pop moderna. Mergulhando fundo nos textos e pedras onde esses símbolos estão gravados, desvendamos não apenas um alfabeto, mas uma visão de mundo. O relacionamento simbiótico entre Odin e as runas, documentado em inscrições antigas e sagas como a Edda Poética, nos oferece valiosos insights. Por exemplo, é fascinante que a Pedra de Noleby, na Suécia, datada do século 7, ecoe o relato onde Odin, o deus da sabedoria, guerra e magia, reivindicou as runas como um dom divino para a humanidade.
Essa fascinação duradoura pelas runas transcende a mera curiosidade histórica. Alimenta uma necessidade humana profundamente enraizada por significado, mistério e um toque de magia. Então, da próxima vez que você se deparar com uma runa — seja em um museu, um livro ou até mesmo uma tatuagem — pare e reflita. O que você está vendo não é apenas um relicário de uma era passada, mas um testemunho vivo do anseio humano por conexão com o insondável, o místico e, sim, o divino.
Com informações de Muy Interesante