Arqueólogos fazem descoberta perturbadora dentro da ‘Caverna de Sangue’ usada pelos maias para rituais antigos Arqueólogos fazem descoberta perturbadora dentro da 'Caverna de Sangue' usada pelos maias para rituais antigos

por Lucas Rabello
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No coração da selva guatemalteca, escondida sob as ruínas da antiga cidade maia de Dos Pilas, uma caverna carrega um nome que desperta curiosidade e mistério: a Cueva de Sangre, ou “Caverna do Sangue”. Por décadas, esse local intrigou pesquisadores, e novas descobertas estão revelando detalhes sombrios sobre seus segredos ancestrais.

A Caverna do Sangue faz parte de uma rede de pelo menos 14 cavidades subterrâneas na região de Petén, usadas pelo povo maia entre 400 a.C. e 250 d.C. Escavações realizadas nos anos 1990 já haviam revelado centenas de ossos humanos no local, mas análises recentes trouxeram à tona indícios de práticas rituais que explicam o nome assustador do lugar.

Os restos mortais, pertencentes a homens, mulheres e até crianças, não estavam simplesmente enterrados. Eles foram encontrados em superfícies rochosas, espalhados e fragmentados, com marcas de ferimentos traumáticos que ocorreram próximos ao momento da morte.

Muitos dos ossos encontrados na Caverna do Sangue apresentavam sinais de lesões traumáticas (Michele Bleuze).

Muitos dos ossos encontrados na Caverna do Sangue apresentavam sinais de lesões traumáticas (Michele Bleuze).

Segundo Ellen Fricano, antropóloga forense da Western University of Health Sciences, as lesões nos ossos sugerem que os indivíduos foram desmembrados de forma intencional. Em um crânio, por exemplo, há uma fissura na região frontal esquerda, possivelmente causada por um instrumento cortante, como um machado.

Outros fragmentos ósseos exibem cortes profundos, compatíveis com lâminas de obsidiana — material abundante no local e frequentemente associado a rituais maias. Para os especialistas, esses padrões não indicam enterros convencionais, mas sim sacrifícios.

Michele Bleuze, bioarqueóloga da California State University, reforça essa hipótese. Ela explica que, na cosmovisão maia, partes do corpo tinham valor simbólico tão significativo quanto o cadáver completo. O desmembramento, portanto, poderia estar ligado a cerimônias que envolviam oferendas aos deuses ou rituais de renovação cósmica, comuns em uma sociedade que via o sacrifício como um elo entre o mundo físico e o espiritual.

Além dos ossos, artefatos encontrados na caverna — como pontas de lança, facas de pedra e vasos cerâmicos — reforçam a conexão com práticas ritualísticas. A presença desses objetos sugere que o espaço era preparado para cerimônias complexas, onde a violência ritualizada desempenhava um papel central.

Curiosamente, a Caverna do Sangue não era um local isolado de sacrifício. Outras cavidades na região também apresentam evidências de atividades semelhantes, indicando que o uso de cavernas para rituais era uma tradição disseminada entre os maias do período pré-clássico.

Arqueólogos fazem descoberta perturbadora dentro da 'Caverna de Sangue' usada pelos maias para rituais antigos

Entrada da caverna perto de El Duende (Noche de la pena/Wikimedia Commons)

Apesar dos avanços, muitas perguntas permanecem. A análise dos ossos está em estágio inicial, e os pesquisadores ainda buscam entender quem eram essas pessoas. Seriam prisioneiros de guerra? Voluntários escolhidos para honrar divindades? Ou membros da elite em contextos específicos? A distribuição dos fragmentos — sem padrões claros de organização — também desafia interpretações.

Enquanto isso, a própria geografia da caverna acrescenta camadas ao mistério. Acessada por estreitas passagens subterrâneas, seu interior úmido e escuro provavelmente era visto como um portal para o submundo, o Xibalba, na mitologia maia. Para uma civilização que atribuía profundo significado aos elementos naturais, realizar rituais em um ambiente tão carregado simbolicamente só amplificava o poder espiritual das cerimônias.

Novas tecnologias, como análise de DNA e datação por radiocarbono, podem ajudar a desvendar a origem dos indivíduos sacrificados e o período exato em que os eventos ocorreram. Cada osso, cada artefato, é uma peça de um quebra-cabeça que revela não apenas a história da Caverna do Sangue, mas também a complexidade de uma cultura que, mesmo após séculos, continua a fascinar e desafiar nosso entendimento.

Fundador do portal Mistérios do Mundo (2011). Escritor de ciência, mas cobrindo uma ampla variedade de assuntos. Ganhou o prêmio influenciador digital na categoria curiosidades.
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