Você já conheceu alguém que parece viver em um mundo próprio, onde tudo gira em torno de suas necessidades, opiniões e histórias? Esse comportamento pode ser um sinal de egocentrismo adulto, um traço que vai muito além da simples imaturidade e que, embora não seja classificado como um transtorno psicológico, pode gerar conflitos em relacionamentos e no convívio social. Entender como ele funciona ajuda a identificar padrões e até a lidar melhor com pessoas que apresentam essas características.
O Que É Egocentrismo Adulto?
Na infância, o egocentrismo é parte natural do desenvolvimento. Crianças pequenas, segundo o psicólogo suíço Jean Piaget, não conseguem compreender que outras pessoas têm perspectivas diferentes das suas. Conforme amadurecemos, aprendemos a considerar pontos de vista alheios. No entanto, em alguns adultos, essa habilidade não se desenvolve plenamente. O egocentrismo nessa fase se manifesta como uma dificuldade persistente de reconhecer ou valorizar as perspectivas, emoções e necessidades dos outros.
De acordo com Laura Palomares, psicóloga e sexóloga, o egocentrismo não significa que a pessoa seja má ou intencionalmente egoísta. Trata-se, na maioria dos casos, de uma limitação na capacidade de sair do próprio universo mental. Ou seja: o egocêntrico prioriza seus interesses não por querer prejudicar os outros, mas porque genuinamente não percebe que está ignorando quem está ao seu redor.
Como Reconhecer uma Pessoa Egocêntrica?
O Gabinete Psicológico de Mataró, na Espanha, lista traços comuns que ajudam a identificar o egocentrismo em adultos. Um dos mais marcantes é a sensação de grandiosidade. Essas pessoas costumam se considerar especiais, acreditando possuir talentos ou habilidades únicas que só seriam reconhecidas por alguém “à altura”. Curiosamente, essa autoconfiança exagerada muitas vezes esconde inseguranças profundas. A persona de segurança inabalável serve como uma armadura para proteger uma autoestima frágil.
Outra característica é a distorção da realidade. Egocêntricos criam uma autoimagem idealizada, ignorando fatos que contradizem essa visão. Se alguém aponta um erro ou faz uma crítica, a reação costuma ser de irritação ou negação. Para eles, qualquer questionamento é uma ameaça à sua imagem perfeita. Essa rigidez mental dificulta o crescimento pessoal, já que aprender com os erros exige reconhecer falhas — algo que seu mecanismo de defesa bloqueia.

Sentimentos de grandeza são uma característica dos egocêntricos.
A falta de empatia também é um sinal evidente. Egocêntricos têm problemas para ouvir verdadeiramente os outros. Em conversas, mesmo que escutem, frequentemente redirecionam o diálogo para si mesmos. Por exemplo: se um amigo compartilha uma dificuldade no trabalho, o egocêntrico pode responder com algo como “Isso é nada, vou te contar o que eu passei…”. Esse comportamento não é necessariamente maldoso, mas revela uma incapacidade de se conectar com as emoções alheias.
Além disso, essas pessoas buscam validação constante. Elas se frustram quando não são o centro das atenções e tendem a comparar-se com os outros para reforçar sua suposta superioridade. Se alguém recebe um elogio, o egocêntrico pode menosprezar o feito alheio ou destacar uma conquista própria, mesmo que o assunto não tenha relação.
Egocentrismo vs. Narcisismo: Não São a Mesma Coisa
Embora sejam confundidos, egocentrismo e narcisismo têm diferenças cruciais. Segundo Elisaveta Franzoso, psicóloga especialista em Terapia Gestalt, a distinção está na consciência do outro. Enquanto o egocêntrico não consegue enxergar perspectivas diferentes da sua, o narcisista até reconhece que os outros têm opiniões, mas não se importa. Para ele, as pessoas são ferramentas para atingir seus objetivos.
Robert Taibbi, especialista da Psychology Today, explica que o narcisismo envolve manipulação e exploração intencional dos outros. Narcisistas são capazes de fingir empatia para conseguir o que querem, enquanto egocêntricos raramente usam táticas manipuladoras — sua falta de consideração é mais passiva.
As origens desses traços também divergem. Crianças mimadas, que receberam atenção excessiva sem limites, têm maior propensão ao narcisismo. Já o egocentrismo pode surgir em filhos únicos, que não precisaram competir por atenção na infância, ou em adultos que desenvolveram padrões rígidos de pensamento como forma de proteção emocional.
Como o Egocentrismo Afeta as Relações?
Conviver com uma pessoa egocêntrica pode ser desgastante. Em relacionamentos amorosos, por exemplo, o parceiro muitas vezes se sente invisível, já que suas necessidades são sistematicamente negligenciadas. No trabalho, colegas podem evitar colaborar com alguém que não valoriza contribuições alheias.
A boa notícia é que o egocentrismo, ao contrário do narcisismo, tem maior potencial de mudança. Terapia e autoconhecimento ajudam a desenvolver habilidades sociais e emocionais, como escuta ativa e empatia. Para quem convive com egocêntricos, estabelecer limites claros e comunicar necessidades de forma direta (sem esperar que adivinhem) é uma estratégia eficaz.
Fatores Que Alimentam o Egocentrismo
Além da criação, experiências traumáticas podem contribuir para o egocentrismo adulto. Pessoas que sofreram rejeição ou humilhação, por exemplo, podem adotar uma postura egocêntrica como escudo contra futuras feridas. Condições como ansiedade social também estão ligadas a esse comportamento: o foco excessivo em si mesmo surge como tentativa de controlar como os outros as veem.
A cultura individualista moderna, que celebra o sucesso pessoal acima do coletivo, também pode reforçar tendências egocêntricas. Redes sociais, onde cada um constrói uma imagem curada de si, oferecem terreno fértil para comparações e busca de validação externa — dois combustíveis do egocentrismo.
É Possível Ser um Pouco Egocêntrico?
Todos temos momentos de egocentrismo. Situações de estresse, cansaço ou insegurança podem nos fazer fechar os olhos para os outros temporariamente. A diferença está na frequência e na intensidade. Quando o comportamento é constante a ponto de prejudicar relações e gerar isolamento, é sinal de que algo precisa ser revisto.
O egocentrismo adulto não define uma pessoa por completo. Muitas vezes, é um padrão aprendido que pode ser desconstruído com esforço e apoio adequado. Reconhecer essas características em si mesmo ou em outros é o primeiro passo para criar interações mais saudáveis e equilibradas.