Por que o casco dos navios é pintado de vermelho?

por Lucas Rabello
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A tradição de pintar os cascos dos navios de vermelho remonta a milhares de anos atrás, em civilizações marinhas antigas como Cartago e Grécia. Durante essa era, os vasos eram primariamente construídos de madeira, e o pigmento vermelho servia a uma função protetora ao invés de puramente estética. Os marinheiros utilizavam uma mistura de minium, gorduras animais e outras substâncias para criar uma barreira contra organismos marinhos como cracas e vermes, que representavam uma ameaça à integridade estrutural dos navios de madeira ao perfurá-los.

Nos tempos modernos, a prática de aplicar tinta vermelha nos fundos dos navios persistiu, embora por razões que evoluíram com os avanços na engenharia marítima. A tonalidade vermelha dos cascos dos navios contemporâneos é atribuída primariamente ao uso de tinta anti-incrustante, que contém compostos à base de cobre. Esses compostos são responsáveis pela cor distintiva da tinta. A incorporação de cobre na tinta é uma prática que se originou no século XVIII, quando a Marinha Real Britânica começou a usar placas de cobre para cobrir os cascos de seus vasos. O cobre é renomado por suas propriedades biocidas, que o tornam eficaz na prevenção da bioincrustação — termo que descreve o acúmulo indesejável de organismos aquáticos nas superfícies dos navios.

Transitando de placas de cobre para tinta infundida com cobre, a indústria marítima continuou a aproveitar as características biocidas do cobre para manter a eficiência dos vasos. O lento vazamento de cobre da tinta anti-incrustante para a água circundante cria um ambiente que desencoraja a vida marinha a aderir ao casco do navio. Este avanço tecnológico tem implicações significativas para a navegação marítima, pois a bioincrustação pode aumentar dramaticamente a aspereza da superfície de um vaso, levando a um maior arrasto e, consequentemente, a um aumento no consumo de combustível.

Um estudo publicado no Biofouling Journal em 2011 destacou que mesmo uma bioincrustação mínima, comparável à aspereza de uma lixa, poderia levar a um aumento no uso de combustível de até 40%. Assim, a aplicação de tinta anti-incrustante não é apenas uma medida para proteger o vaso, mas também uma prática essencial para promover a eficiência energética e reduzir os custos operacionais.

No entanto, o uso de tintas anti-incrustantes à base de cobre não está isento de repercussões ambientais. A liberação gradual de cobre nos ambientes marinhos pode ter efeitos deletérios na vida aquática, particularmente em regiões onde a concentração do metal se torna tóxica. Isso gerou debates e ações regulatórias em várias partes do mundo, incluindo certas regiões da Califórnia, onde o impacto ambiental dessas tintas levou a restrições em seu uso. A preocupação centraliza-se no equilíbrio ecológico e na biodiversidade dos ecossistemas marinhos, que podem ser perturbados pela presença de cobre em altas concentrações.

Em resposta aos desafios ambientais impostos pelas tintas anti-incrustantes à base de cobre, as comunidades científica e de engenharia estão explorando ativamente soluções alternativas que possam oferecer propriedades anti-incrustantes eficazes sem os riscos ecológicos associados. Pesquisas recentes mergulharam no potencial de estratégias não tóxicas, como o desenvolvimento de superfícies inspiradas na pele de tubarões. A pele do tubarão, que é coberta por estruturas microscópicas semelhantes a dentes conhecidas como dentículos, resiste naturalmente ao crescimento de microorganismos. Replicar essa superfície biomimética nos cascos dos navios poderia oferecer uma abordagem inovadora e ecologicamente correta para combater a bioincrustação.

Lucas Rabello
Lucas Rabello

Fundador do portal Mistérios do Mundo (2011). Escritor de ciência, mas cobrindo uma ampla variedade de assuntos. Ganhou o prêmio influenciador digital na categoria curiosidades.