Algo está acontecendo com o vórtice polar e pode ter consequências para o Brasil

por Lucas Rabello
7,2K visualizações

As regiões polares da Terra estão passando por mudanças incomuns e potencialmente preocupantes, especialmente no que diz respeito aos vórtices polares. Esses são poderosas correntes de ar que circulam na alta atmosfera sobre o Ártico e a Antártica durante suas respectivas estações de inverno. Normalmente, esses vórtices ajudam a manter o ar frio preso perto dos polos, mas eventos recentes têm deixado os cientistas preocupados com sua estabilidade.

Vamos começar pelo vórtice polar sul, que atualmente está mostrando sinais de instabilidade bastante raros. Isso está causando preocupação entre os especialistas que temem que ele possa colapsar. Se isso acontecer, pode levar a padrões climáticos extremos no hemisfério sul, incluindo tanto ondas de frio incomuns quanto ondas de calor intensas.

Para entender por que isso está acontecendo, precisamos olhar para o funcionamento dos vórtices polares. Eles são essencialmente cercados por correntes de jato, que atuam como barreiras mantendo o ar polar frio no lugar. No entanto, às vezes o ar na estratosfera (uma camada da atmosfera acima de onde ocorre a maioria dos fenômenos meteorológicos) pode aquecer repentinamente e aumentar a pressão. Isso é chamado de aquecimento súbito da estratosfera, ou SSW (do inglês, Sudden Stratospheric Warming).

Quando o vórtice polar se desestabiliza, o ar polar gelado se move para as latitudes médias.

Quando o vórtice polar se desestabiliza, o ar polar gelado se move para as latitudes médias.

Quando um SSW ocorre, ele pode perturbar o vórtice polar, fazendo-o se dividir, mudar de direção ou até mesmo colapsar completamente. Essa perturbação pode levar a uma distorção na corrente de jato, permitindo que o ar frio polar se mova mais para o sul do que o usual, enquanto o ar mais quente de latitudes inferiores pode avançar para as regiões polares.

No hemisfério norte, esses eventos de SSW acontecem com mais frequência. Por exemplo, no início de 2024, o vórtice polar norte mudou de direção duas vezes devido a mudanças na pressão estratosférica. Isso trouxe ondas de frio para partes do hemisfério norte, embora os efeitos não tenham sido tão dramáticos quanto poderiam ter sido.

O vórtice polar sul, no entanto, é uma história diferente. Eventos de SSW são muito mais raros na região antártica, com apenas uma ocorrência conhecida registrada em 2002. É por isso que a situação atual está causando tanta preocupação entre os cientistas. Desde meados de julho, tem havido uma série de aumentos de temperatura na estratosfera acima da Antártica, levantando temores de que o vórtice polar sul possa estar prestes a se dividir.

Os primeiros sinais de problema apareceram em julho, quando a velocidade dos ventos no vórtice diminuiu significativamente, e as temperaturas aumentaram cerca de 20 graus Celsius acima da média. Embora isso não tenha sido suficiente para desencadear um evento completo de SSW, foi seguido por outra desaceleração e aumento de temperatura no início de agosto.

Como resultado dessas mudanças, o ar frio antártico conseguiu escapar da região polar, trazendo clima úmido e gelado para partes da Austrália, Nova Zelândia e América do Sul. Portanto, poderemos ter recordes de frio no Sul do Brasil. Ao mesmo tempo, o ar mais quente de latitudes inferiores avançou para a Antártica, causando uma onda de calor recorde na região.

O futuro do vórtice polar sul permanece incerto. Algumas previsões sugerem que ele pode se estabilizar em breve, enquanto outras apontam para um colapso mais drástico. Se o vórtice colapsar, pode perturbar outro sistema climático chamado modo anular sul, potencialmente levando a um verão excepcionalmente seco e quente em Australásia e América do Sul, incluindo Brasil.

Os cientistas ainda estão tentando entender exatamente o que causa essas perturbações nos vórtices polares. No entanto, há evidências crescentes de que as mudanças climáticas induzidas pelo homem podem estar desempenhando um papel. Um estudo recente encontrou uma ligação entre a diminuição do gelo marinho antártico e a redução da velocidade dos ventos na estratosfera, sugerindo que o aumento das temperaturas dos oceanos pode estar interferindo nos vórtices polares.

Isso é particularmente preocupante porque, enquanto o gelo marinho do Ártico tem diminuído há anos, a Antártica era considerada relativamente estável até recentemente. Mas nos últimos anos, houve uma queda preocupante no gelo marinho ao redor da Antártica também. Isso sugere que ambos os polos podem estar entrando em um estado de mudança extrema, o que pode ter implicações significativas para os vórtices polares e os padrões climáticos globais.

À medida que continuamos a lidar com os efeitos das mudanças climáticas, entender esses sistemas atmosféricos complexos torna-se cada vez mais importante. Os vórtices polares desempenham um papel crucial na regulação dos padrões climáticos globais, e sua desestabilização pode levar a eventos climáticos extremos mais frequentes em todo o mundo.

Lucas Rabello
Lucas Rabello

Fundador do portal Mistérios do Mundo (2011). Escritor de ciência, mas cobrindo uma ampla variedade de assuntos. Ganhou o prêmio influenciador digital na categoria curiosidades.